Renegociar – questão de justiça e sobrevivência

Publicado por Ana Lacerda em

Os efeitos da crise ocasionada pelo coronavírus foram e ainda são sentidos de várias maneiras. Do ponto de vista econômico, atravessamos um momento bastante delicado, em que muitas empresas tiveram que fechar suas portas; pessoas perderam o emprego e/ou fontes de renda e todo esse rearranjo implica necessariamente em numerosas renegociações.

Nesse sentido, ao lidar com os resultados causados pelo vírus, que não respeitaram nenhum tipo de fronteira, tornou-se imperioso que as partes que tiverem entre si alguma relação contratual sejam flexíveis para rediscutirem essa situação, avaliando a premissa do equilíbrio contratual.

Há que se rememorar que no sistema jurídico brasileiro não se pode simplesmente deixar de cumprir uma obrigação contratual alegando motivos imprevistos ou incontroláveis, generalizando os casos. É preciso que cada contrato seja verificado pontualmente. Alguns deles nem precisarão ser revistos; já outros terão como premissa para continuidade, a reavaliação de fatores específicos. Nessas medidas, pode haver a variação do mesmo evento, em diferentes contextos, como caso fortuito ou acontecimento extraordinário.

Insta destacar que quando falamos de uma necessária renegociação, não estamos nos referindo à hipótese de tomar medidas para que se altere, ou se revise extrajudicialmente o que estava previsto na relação contratual, outrossim, que se encontre caminhos alternativos a fim de que ela seja cumprida, considerando as circunstâncias como fator preponderante para tanto.

Na via de renegociar é imprescindível que haja uma comunicação bastante eficiente entre as partes, tanto daquela que percebe um desequilíbrio, quanto daquela que foi comunicada da dificuldade e necessita posicionar-se em busca de uma solução razoável. Dessa maneira, propicia-se a atmosfera de reciprocidade e transparência, tão importantes nas tratativas em geral, com o objetivo de que se concretize o escopo contratual, por meio de mútua cooperação.

“Na via de renegociar é imprescindível que haja uma comunicação bastante eficiente entre as partes, tanto daquela que percebe um desequilíbrio, quanto daquela que foi comunicada da dificuldade e necessita posicionar-se em busca de uma solução razoável.”

O dever de renegociar é um remédio quando do desequilíbrio contratual superveniente, e ganha espaço cada vez que, em face desse desequilíbrio, está-se diante de uma patologia interna ao contrato. No caso da corrente pandemia, verifica-se que a manutenção de determinadas cláusulas contratuais sem renegociação, podem ocasionar a impossibilidade temporária e/ou permanente da prestação de determinado serviço e até mesmo o fim do contrato.

O fundamento para renegociar os contratos está estampado na cláusula geral de boa-fé objetiva (art. 422 do Código Civil), que impõe aos contratantes o dever de agirem de maneira leal, transparente, para atingirem o objeto proposto na negociação.

Importante ressaltar o aspecto da uniformidade e coerência no dever da renegociação. Como exemplo, uma empresa que concede desconto a um contratante, sob contrato idêntico e mesmas circunstâncias, sem nenhuma justificativa para diferenciação; não pode deixar de conceder exatamente o mesmo desconto aos demais.

De outra orientação, sublinhamos que a tentativa de renegociar reduz os já tão avolumados estoques processuais do judiciário, levando a uma possiblidade de solução mais célere e eficiente e cabe perfeitamente em situações como as enfrentadas na contemporaneidade.

A famosa frase atribuída a Charles Darwin, autor da obra mundialmente conhecida e atemporal “A origem das espécies”, tem encaixe perfeito nesse cenário: “Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças.”. É urgente ajustar-se.

Fonte: rdnews.com.br

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