Posse e propriedade – como garantir?
As questões sobre a terra e a quem ela pertence permeiam os conflitos desde o início dos tempos. Quando o ser humano deixou de ser nômade para se fixar em algum local e ali construir um patrimônio e sustentar a família, nasceram também as disputas territoriais.
Desde então, na tentativa de sistematizar a conduta do homem com o objetivo de possibilitar uma convivência mais harmônica, ao longo do tempo, criaram-se legislações visando tutelar a posse e a propriedade. Assim, é preciso lembrar que existe uma série de requisitos e detalhes que podem definir quem realmente tem direito sobre determinado bem.
Posse e propriedade são conceitos que, apesar de parecerem muito próximos, divergem entre si nas minúcias, fato que pode levar alguém a sofrer grandes prejuízos e ter que lidar com transtornos descomunais.
Não é à toa que nossos antepassados, sábia e popularmente, alertavam “o seguro morreu de velho”, dando a entender que quem toma as devidas precauções não morre cedo, não é pego de surpresa. Em que isso se relaciona com o assunto em pauta? No seguinte aspecto: não basta ter a posse de um bem para ser considerado proprietário; tampouco, o simples fato de ser proprietário garante que o imóvel esteja seguro e pertencerá sempre ao mesmo dono. É o que se demonstra a seguir:
No que concerne à posse, no direito brasileiro foi adotada a teoria objetiva, de Ihering. Nas palavras encontradas na doutrina de Carlos Roberto Gonçalves tem-se uma argumentação bastante simples: “Para que a posse exista, basta o elemento objetivo, pois ela se revela na maneira como o proprietário age em face da coisa.”
O Código Civil, art. 1.196 define: “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.” Assim sendo, a posse está muito mais relacionada a um comportamento do sujeito, que exerce poder sobre determinado bem. Vale ressaltar: nem todo possuidor é proprietário.
Já o conceito de proprietário está regulamentado no art. 1.228, do mesmo código supracitado: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”
Dessa maneira, o proprietário é o sujeito que usa a terra, seus respectivos frutos; pode dispor-se dela e reivindicá-la de quem a possua ou detenha injustamente. Em resumo, o proprietário é realmente o dono de um bem, mediante comprovação. Em decorrência desse fato, possui a faculdade de utilizar todas as funções do bem em questão; trocar ou vender, dando a destinação oportuna e reavê-lo de quem quer que seja.
Uma ilustração comum dessa relação de proprietário e possuidor é o que acontece na relação entre locador e locatário. O primeiro tem a propriedade do bem, todavia, é o locatário que exerce a posse física do objeto.
Insta destacar que o ordenamento jurídico também tutela e protege as relações possessórias. A posse é um ato jurídico latu sensu e representa o exercício de fato, pleno ou não, de um dos poderes da propriedade.
Com o intuito de defender a posse, existem as chamadas “ações possessórias”, que são constituídas das ações de reintegração de posse, manutenção de posse e interdito proibitório.
Nas ações possessórias não se discute a propriedade. Dessa forma, de início, o que se discute não é a quem pertence, legitimamente, o imóvel; mas, sim, interessa quem exerce a posse, independentemente de ser o proprietário. Nesses casos, se o autor da ação não comprovar que exerceu a posse sobre a coisa disputada anteriormente à turbação ou esbulho, não fará jus à proteção possessória. Correto seria ajuizar ação petitória (ação de proprietário não possuidor contra possuidor não proprietário) para recuperar o bem.
Ainda sobre esse viés, é comum vermos o ajuizamento de ação possessória por parte do proprietário de um bem, para fins de tentar recuperar a posse que nunca exerceu. Há de se tomar muito cuidado, e analisar pormenorizadamente toda a situação fática e documental antes de se ingressar em juízo. O ajuizamento de ação possessória no lugar da ação reivindicatória autoriza o magistrado a extinguir o processo, pois nesse caso não é possível o aproveitamento da ação inadequada, nem mesmo a aplicação do princípio da fungibilidade (exclusivo das ações possessórias).
Ingressar com uma ação inadequada, além de não garantir o direito pretendido, gera prejuízos de diversas ordens. Ademais do tempo que se perde com todo o processo judicial, na juntada de documentos e no próprio decorrer da ação, também se investe financeiramente e ainda se corre o risco de não se alcançar os fins objetivados, ocasionando um esforço gerador de estresse que em nada mais acrescenta.
Artigo Publicado no RD News .
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